Nunca Xavier Bichat, anatomista francês do século XIII e percussor da histologia, pensou que aquelas “bolsas” ou “bolas” de gordura encapsuladas que descreveu, situadas nas bochechas, pudessem vir a ser protagonistas de algum tipo de “moda cirúrgica”. E certamente ficaria exasperado se visse o seu nome ser meio adulterado para designar algum tipo de procedimento cirúrgico envolvendo as suas, agora, famigeradas “bolas”.
A “bichectomia”, “bichatectomia” ou LIPECTOMIA JUGAL (designação médica) é a remoção cirúrgica, por dissecção, das bolsas adiposas da região jugal (bochecha).
Se por um lado, a curiosidade vai no sentido de saber tudo o que envolve o procedimento cirúrgico e os seus benefícios, por outro, é bom saber qual o papel das bolsas adiposas de Bichat no organismo humano. Será que a natureza criou estruturas que não servem para nada?
É-lhes atribuído um papel na amamentação, funcionando, durante a sucção, como parte do sistema anticolapso da bochecha do bébé. A partir daí não se lhes reconhece qualquer função. No entanto a sua utilidade é manifesta, quando a elas recorremos para encerrar orifícios de comunicação entre a cavidade bocal e os seios maxilares, a maior parte das vezes, sequelas de extrações dentárias. Aproveitando a sua estratégica posição e o facto de serem confinadas por uma espécie de cápsula laxa que permite o seu estiramento, mantendo a estrutura inteira e pediculada, elas podem ser distendidas até ao local a encerrar mantendo a sua circulação sanguínea. Esta sua importante função de “remendo” (patch) é cada vez mais aproveitada em cirurgia reparadora bucal. Por outro lado, o seu envolvimento patológico é muito raro. Foram descritos lipomas.
Depois de um pormenorizado diagnóstico, a cirurgia de remoção está indicada, nos casos selecionados, para amenizar ou corrigir a incómoda saliência das bochechas, tornando a face mais fina e ovalada. É, desde há muito, por nós usada sempre que diminuimos a altura um rosto com cirurgia ortognática e prevemos que alargará demasiado.
O efeito mais marcado é o aparecimento e demarcação do triângulo jugal, depressão suave logo abaixo da eminência malar-zigomática, com vértice na intersecção do masséter com o zigoma e base larga no suco lábio geniano, e que enfatiza o que há de melhor na estética de um rosto – os desejados contornos, as suaves depressões, as peculiares luminosidades, os traços e as linhas que definem uma boa estética facial.
A cirurgia, realiza-se por via intra-oral, sob anestesia local, com uma incisão de 5 mm na região jugal, com mínima dissecção para evitar o traumatismo cirúrgico e danos de estruturas nobres da região, em particular o ramo bucal do nervo facial. A remoção deve ser de volumes iguais e a sutura com pontos reabsorvíveis. Só deve ser executada por cirurgiões. E experientes.
O pós operatório é tranquilo. Devem-se seguir as recomendações habituais.
A cirurgia não impede a actividade física moderada. De início, recomendam-se caminhadas progressivas a partir do 2º dia.
O “período invisível”, devido ao edema residual, depende das actividades profissionais sendo, em média, de 10 dias.
A. Matos da Fonseca
Médico | Cirurgião Maxilofacial
Director da Clínica da Face
Lisboa – Portugal