Apesar de nenhuma face ser perfeitamente simétrica, só se considera assimétrica, aquela em que exista uma desarmonia perceptível entre as características de um determinado traço facial e o seu homólogo situado do lado oposto, nos eixos vertical e horizontal.
As assimetrias dos maxilares podem ser consequência de anomalias do crescimento e desenvolvimento da face, de traumatismos e de processos patológicos que podem ser primários (ameloblastomas, quistos, etc.), em que a localização anatómica do processo e a da assimetria são idênticas, ou secundários (hiperplasia ou hipoplasia condiliana, osteocondromas, etc.), quando a localização anatómica do processo patológico e a assimetria são distintas.
Quanto mais precoce na idade for o processo patológico que induz a assimetria, maiores serão as repercussões na posição, forma e volume das estruturas esqueléticas, dentárias e sobre os tecidos moles.
As situações clínicas que envolvem assimetria mandibular ou maxilo-mandibular são vulgarmente consideradas como sendo as de maior complexidade nas fases de diagnóstico, de planeamento e na execução terapêutica seja ortodôntica ou cirúrgica.
É preciso reconhecer a existência da desarmonia, mapear a sua localização e a sua magnitude, sabendo interpretar o contributo das estruturas dento-esqueléticas e dos tecidos moles de revestimento na forma de manifestação e na aparência da assimetria.
Como em todos os casos, o diagnóstico clínico dependerá da capacidade de identificar o maior número de problemas. Na fase inicial não interessa saber quantos milímetros tem um determinado desvio ou a grandeza da anomalia da forma. Interessa identificar e registar as zonas que requerem correcção. A filosofia de trabalho é identificar as anomalias para as poder tratar. Porque o que não é detectado não será tratado porque não existe como problema.
A abordagem das assimetrias envolve uma ampla avaliação, compreendendo a história clínica, o exame clínico e fotográfico, a exploração radiológico nomeadamente recorrendo a TAC 3D, cefalometria radiológica e estudos do crescimento.
A avaliação clínica da face assimétrica é similar à de outras deformidades dentofaciais. Contudo, envolve um conjunto de detalhes importantes cuja descrição são o objectivo deste trabalho. Nomeadamente o reconhecimento e confirmação, durante o exame, da presença de:
O primeiro passo do exame clínico da face é detectar a presença de assimetria mandibular. É muito importante ter em conta a posição da mandíbula no instante da observação. Teoricamente, a verificação do possível desvio da mandíbula só se pode efectuar no momento do primeiro contacto dentário em cêntrica, para impedir um eventual desvio devido a interferência. Aceita-se, na prática, que a decisão seja tomada no momento em que as arcadas contactam levemente.
A constatação da existência de assimetria mandibular esquelética deverá levar, desde logo, à indicação de tratamento combinado ortodôntico-cirúrgico. A terapêutica ortodôntica isolada poderá camuflar o problema, mas nunca poderá, como é óbvio, corrigir a assimetria facial.
Havendo divergência transversal das bases ósseas, a camuflagem ortodôntica é alcançada à custa das inclinações transversais dos dentes das duas arcadas.
A técnica de arco recto, baseada na aplicação de brackets com prévia informação de inclinações e torques, é hoje a mais utilizada no mundo. Em situações de assimetria mandibular “ligeira”, em que as compensações dentárias transversais são quase imperceptíveis, é vulgar acontecer, durante o decorrer do tratamento isolado, que os dentes comecem a ter uma posição mais correcta na arcada, induzida pela “informação” das brackets e, por isso, ao descompensar as inclinações dentárias a assimetria se torne mais evidente e impossível de corrigir só com ortodontia.
A observação inicia-se com o doente de pé, de frente para o médico, olhando-o nos olhos. O médico orienta a posição da cabeça do doente, para evitar desvios rotacionais ou inclinações, e imagina uma linha média facial. Este propósito nem sempre é fácil porque é comum a presença de uma distopia orbitária moderada e desvio nasal associados.
Nas maioria das assimetrias dos maxilares um dos lados da face encontra-se sempre mais estirado que o outro, facto nem sempre tido em conta. Esta diferente tensão de estiramento dos tecidos moles condiciona a projecção dos tecidos da região geniana, o posicionamento dos lábios e das comissuras labiais, em particular do vértice do filtro, das pálpebras inferiores e de outros pontos de referência habitualmente utilizados, e pode induzir erros de diagnóstico.
Contrasta, muitas vezes, a flacidez de um lado, com o estiramento do lado contrário. Quanto mais precoce for a assimetria maior será o contraste futuro, devido à diferente tensão e volume dos tecidos moles.
A correcção ortognática permite colocar na linha média facial as várias estruturas e remodelar determinadas zonas, mas não soluciona esta diferença de volume dos tecidos que pode comprometer o resultado final.
O lado antes estirado é agora redundante e vice-versa. A solução destas situações pode passar pela necessidade de futuro “lifting” do lado redundante ou “lipofilling” do lado com défice de volume.
Nas assimetrias mandibulares é frequente verificar-se a existência de um aparente desvio da linha média superior em relação ao vértice do filtro do lábio. No entanto, este pode dever-se ao repuxamento do filtro do lábio e das comissuras labiais, que por estarem desviados (os tecidos moles são traccionados para o lado do desvio da mandíbula), induzem em erro o observador.
Esta situação corrige-se movimentando lateralmente a mandíbula, alinhando o mento cutâneo com a linha média interincisiva superior (LMIS). Se o mento ósseo também estiver muito desviado, dever-se-á procurar a posição mentoniana em que as forças laterais de tracção dos tecidos moles mais se equilibrem.
Após esta manobra, ter-se-á uma diferente visão, com uma percepção mais realista do posicionamento da linha média superior.
Num maxilar superior bem posicionado tridimensionalmente todos os desvios da linha média interdentária superior têm origem dentária e por isso necessitam correcção ortodôntica prévia.
Quanto mais antiga é a assimetria mandibular, maiores repercussões se encontrarão na posição do maxilar superior. Logo, a história clínica pode sugerir-nos se as repercussões posicionais no maxilar serão mais ou menos evidentes.
Deve-se verificar, no maxilar superior, se a exposição dentária e gengival são assimétricas e se o plano oclusal está mais elevado de um lado que do outro.
Após a observação frontal inicial, de pé, deita-se o doente em decúbito dorsal. Nesta posição poderemos ter uma melhor perspectiva axial da discrepância vertical do maxilar.
A LMIS pode estar desviada relativamente à linha média facial (LMF) e existir ou não desvio intra-arcada. A confirmação da existência de desvio e o controlo do tratamento ortodôntico faz-se nos modelos de gesso. Tentar fazê-lo através da observação directa das arcadas ou pelas radiografias frontais é um equívoco comum e fonte de erros de análise.
Se alguma dúvida persistir quanto à existência de assimetria, deve-se deitar o doente em decúbito dorsal e proceder à observação axial. A observação axial superior, do lado da cabeça do doente, evidenciará a assimetria do frontal, nariz, órbitas, lábio superior e mento. A observação axial inferior, do lado dos pés do doente, permite confirmar alguns dados da observação anterior e sobretudo dá acesso visual ao contorno inferior da região mandibular.
No diagnóstico clínico teremos de precisar se a correcção cirúrgica da posição da arcada inferior corrigirá também este desvio ou se afinal, para além de desviado o mento também é assimétrico, o que ditará a necessidade de mentoplastia com osteotomias.
O diagnóstico necessita quase sempre, para além da ortopantomografia, da confirmação através de radiografia frontal, ou melhor ainda, de TAC 3D.
Numa assimetria mandibular primária nem sempre existe um desvio do mento. Nas secundárias, existe sempre.
As assimetrias mandibulares, em particular as que tem origem em anomalias de crescimento, podem manifestar-se como alterações da posição da mandíbula em relação ao eixo facial, mas também como anomalias da forma do côndilo, do ramo, do corpo ou do mento.
Por exemplo as que tem origem numa hipertrofia-hiperplasia do côndilo para além do desvio do eixo mandibular, frequentemente apresentam uma assimetria da forma do corpo e ramo, sendo o lado da hipertrofia convexo e o lado contrário plano ou côncavo. Nas hipoplasias condilianas acontece o contrário.
No diagnóstico clínico teremos de precisar se a correcção cirúrgica da posição da arcada inferior corrigirá também este desvio ou se afinal, para além de desviado o mento também é assimétrico, o que ditará a necessidade de mentoplastia com osteotomias.
O diagnóstico necessita quase sempre, para além da ortopantomografia, da confirmação através de radiografia frontal, ou melhor ainda, de TAC 3D.
Referimo-nos ao problema da forma porque, em muitas situações de assimetria, poderemos corrigir todas as alterações da posição das arcadas, mas não conseguiremos corrigir aceitavelmente a assimetria da forma do corpo e ramo da mandíbula, tendo de recorrer à colocação de implantes faciais nestas localizações.
A. Matos da Fonseca
Médico | Cirurgião Maxilofacial
Director da Clínica da Face
Lisboa – Portugal